Assalto às nossas identidades
Um nome diz muito sobre as origens, o carácter e a história de vida de uma pessoa.
Ontem, no táxi, ouvi atentamente a indignação de uma senhora, de aproximadamente 26 anos, contra a funcionária do registo, pelo facto de esta não aceitar que ela registasse a sua filha, de 3 anos, com o nome de Whitney. Segundo o que contava, a conservadora obrigou-a a escrever o nome corretamente. Nem ela nem a sua acompanhante, irmã do marido, souberam escrever ou explicar o significado do nome.
De acordo com a mãe da menina, não era obrigação dela saber escrever o nome, mas sim da conservadora, e o Estado não tinha por que obrigá-la a dar um nome de origem à sua bebé.
Essa questão dos nomes é muito mais séria do que parece. Por um lado, fiquei feliz por ver que aquela senhora (a conservadora) defendeu a nossa identidade, obrigando os pais a refletirem sobre a questão, pois soube por ela que o processo ficou pendente.
Isto demonstra uma certa evolução na história dos registos em Angola, porque, anteriormente, os nossos nomes eram-nos impostos, e algumas pessoas viram os seus nomes sofrerem alterações devido ao sistema colonial, que impôs os seus costumes e tradições.
Como consequência, hoje temos Sango ao invés de Nsango, que significaria "informação", "notícia" ou "mensagem"; temos Zau ao invés de Nzau, que significaria "elefante". Outro exemplo são as transformações assustadoras que estão a acontecer com os nomes das províncias (Kwanza → Cuanza, Kwando/Kuando → Cuando). Por que, então, o nome da moeda continua a ser com "K" e o do rio que deu nome à moeda, com "C"?
No ano passado, em uma das Makas à Quarta-feira, na UEA, o general Miau falava sobre a abreviatura do nome Uanhenga Xitu, pseudónimo literário de Agostinho André Mendes de Carvalho. O preletor tinha abreviado para Xitu, e o general questionou-o sobre o significado. Este não soube responder. Na sequência, o general deu a explicação:
Xitu = Carne
Uanhenga = Andar com alguma coisa ao pendurão
Uanhenga Xitu = "Os poderosos contam sempre com inimigos à espreita" ou "O poder desperta o ódio nos outros".
Com isso, percebi que, no contexto africano, principalmente no que diz respeito aos nomes, seguir as normas da ABNT altera o seu significado.
Outro exemplo de como os nomes contam histórias pode ser visto em indivíduos que têm sobrenomes femininos. Ter um sobrenome feminino não é, de todo, um problema, mas, em alguns casos, esses sobrenomes revelam histórias de fuga à paternidade, negação do direito ao pai por parte de algumas mães solteiras, ou até mesmo a própria ignorância da população que, em vésperas do ano letivo, prioriza apenas "o mais importante é registar".
Tenhamos cuidado e defendamos a nossa identidade.
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